#55

tão ridiculamente sozinha.
já não sei se fui eu que escavei o buraco sozinha, se tive ajuda ou se o escavaram - bem fundo, profundo - por mim. de fora, só se vêem os meus olhinhos, que não param, que continuam a observar, enquanto outras pernas correm lá fora. dentro do buraco estou só eu. já chamei, pedi ajuda, tentei saltar fora, umas vezes com energia e vontade, outras tantas só porque sim, mas sem resultados. já são dias, meses, de habituação, espera-se que o corpo se torne dormente, a cabeça também, espera-se que passe, que não faça mais mossa. mas quando tudo já passou - shhhh, já passou, digo eu para eu mesma, enquanto virtualmente passo a mão pelo meu cabelo - chega a vergonha, essa desavergonhada, e traz mais daquilo que nunca se foi embora. antes me fizesse saltar deste buraco, de uma vez por todas. quanto mais esperneio, mais os meus pés escavam fundo, destroem as paredes e transformam o buraco num palacete para burros - e o burro sou eu - que não consegue somar dois mais dois, bê à bá, e sair daqui.
podia ser tão fácil, se parasse de acariciar a minha própria cabeça como se de um bebé fragil e coitado me tratasse, como se fosse tudo culpa do mundo e nada minha.
shhhh--
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Lisboa | Amesterdão

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